11 de outubro de 2012

Indicação bibliográfica da profa. dra. tania navarro-swain


Parte da produção bibliográfica da Profa. Dra. tania navarro-swain está disponível em seu site: www.tanianavarroswain.com.br

A CONSTRUÇÃO DAS MULHERES: A RENOVAÇÃO DO PATRIARCADO
tania navarro swain


Os feminismos estão trabalhando para que as mulheres se afirmem enquanto sujeitos políticos, sujeitos de ação, de consciência e reflexão. Seres humanos que não se definam por seu corpo, por um sexo, por uma identidade fictícia que lhes assegura um lugar inferior no social. Aos feminismos o patriarcado responde de várias maneiras: pelos insultos que todas conhecem e não vou retomar aqui, pelo silencio e por uma adaptação insidiosa às conquistas duramente conseguidas pelas mulheres.
Na academia, a tática é o silencio. Apesar de sua incontestável pujança cognitiva e analítica, a produção feminista do conhecimento tem sido mantida em corredores secundários, pois acende o alerta vermelho do desafio ao bio-poder, ao poder patriarcal de criar um conhecimento conjugado no masculino e assim construir a “diferença” entre os seres humanos. A repetição incansável da “diferença dos sexos” recria a ficção do superior/inferior ancorada na ode ao sexo masculino. É portanto, a ênfase e a valorização do sexo como eixo das relações humanas e do sexo masculino como referente máximo que justificam o biopoder.
Frases como “O feminismo acabou”, “as mulheres já conseguiram tudo, o que mais querem?” são recorrentes no cotidiano e buscam apagar a reconstrução constante da “diferença” e do binarismo hierárquico.
Como todas sabem os feminismos almejam a mutação de um social cimentado na dominação e na apropriação dos corpos e do trabalho das mulheres. Entretanto, para além da couraça patriarcal, há fatores, internos aos feminismos, que bloqueiam o desenvolvimento de um saber de ponta, dirigido à transformação dos quadros e métodos de pensamento, visando a diversidade , muito além da “diferença”  de sexo. 
 Se os feminismos primam pela criatividade e renovação, certas categorias podem representar bloqueios a seu desabrochar se utilizadas sem uma problematização e uma perspectiva crítica.
Dentre elas, acredito que teoricamente, o emprego da categoria “gênero” muitas vezes reinstala o discurso da natureza, pois no famoso sistema sexo / gênero, um fundamento biológico, logo natural, estaria incontornavelmente presente.
Ora, a importância dada ao sexo biológico enquanto fundamento do poder, de identidade, do político, é um traço cultural e como bem sublinha Judith Butler, não existe gênero fora de práticas materiais de gênero. E ela vai ainda mais longe, ao afirmar que desta forma o sexo é construído pelo gênero, cuja performance desmascara a irredutibilidade do biológico.  Assim, a utilização acrítica e a- histórica da categoria “gênero”coloca em primeira linha o “natural”, o “sempre foi assim”  em todas as sociedades e espaços de maneira universal, sem levar em conta as especificidades biossociais no espaço /tempo.
Ora, nenhuma biosocialidade é preexistente à sua objetivação, à sua materialização. Ao contrário, é em suas práticas que toma forma a carne e que se criam os sentidos. A denominação “sexo social” já levava em conta esta circunstância pelas feministas dos anos 1970/80 e em meu entender esta é ainda a melhor maneira de significar as relações sexo/ sexualidade no agenciamento societário.
A ingenuidade ou a perversidade que separam natureza e cultura  são  extensões de um bio- poder em ação. Pois o poder atua na carne para melhor extraí-la da trama das relações sociais e lhe atribuir uma significação universal.
O esquecimento da plasticidade de uma coreografia ontológica, como a nomeia Donna Haraway, é de fato uma das realizações do patriarcado que determina uma forma e uma função aos seres segundo apenas um fator: seu sexo biológico.
Os feminismos não cessam de mostrar que os opostos binários  são apenas efeitos de sentido. Desta forma, o sexo não está para a natureza assim como o gênero está para a cultura. Haraway questiona esta divisão e  propõe  em uma só palavra “naturezacultura” como uma única e mesma força, pois  nada é fixado de antemão e uma vez por todas. Assim,  para efeito de análise crítica do social a categoria gênero deve incluir os termos de sua construção.
A dança dos seres, diz Haraway, forma plasticidades diferenciais da carne em cada formação social. Nesta perspectiva, as sócio-conexões são parciais e nunca definidas anteriormente, como querem alguns estudos do “gênero”. As relações sociais são eminentemente históricas e constitutivas na diversidade das experiências sociais. E a história patriarcal apaga, sem pudor, esta amplitude, para oferecer a monotonia de um binário segundo o mesmo molde eterno, o que é retomado  muitas vezes pelo binarismo que pode supor a categoria “gênero”.
As fundações e as origens são contingentes, sublinha Butler. Adão e Eva são apenas representações de um poder avassalador que aspira a se justificar. Como sublinha Haraway “[...] nenhum dos parceiros preexiste a seu relacionamento, este último jamais fixado de uma vez por todas” (19)
As relações humanas são ainda forjadas em um imaginário patriarcal que lhes criam origens universais para melhor justificar sua manutenção. Entretanto, diz Haraway, com humor: “não há fundação, há apenas elefantes empilhados uns sobre os outros até embaixo.” (10)
Da mesma maneira, a ficção patriarcal faz do binário hierárquico o eixo das relações humanas e funda sobre o sexo e a sexualidade seu bio-poder, que se torna então, “indiscutível”. É assim que a categoria “gênero” torna-se um obstáculo ao conhecimento feminista, pois submete as relações bio-sociais ao mesmo esquema do natural sem questionar a importância dada ao sexo em sociedades múltiplas.
Esta é talvez a razão de sua aceitação na academia, já que perdeu sua força de indisciplina, de indignação e se tornou uma categoria domesticada, que não representa nenhuma ameaça para o patriarcado e sua história dita “universal”, da qual as mulheres são apagadas.
O gênero assim utilizado, afasta o perigo dos feminismos, de sua insubmissão, de seu desejo de transformação. O gênero, que não problematiza, apenas descreve, submete-se às garras do patriarcado que renascem sem cessar e se agarram sobre novas superfícies para reproduzir os esquemas de poder.
O patriarcado, tal como o capitalismo, adapta-se às transformações sociais e em sua nova face mistura-se às conquistas realizadas pelas mulheres.
É assim que outro obstáculo maior à difusão e à circulação do conhecimento feminista, à afirmação das mulheres enquanto sujeitos políticos são as mulheres elas mesmas, adotando as significações sociais do que é ser mulher. Pois nesta perspectiva, só se é mulher dentro de certo tipo de relações sociais encabeçadas pela heterossexualidade e por certo tipo de comportamento.
As novas tecnologias de informação e de reprodução humana são colonizadas por este patriarcado cujo fôlego não se esgota. Recitam as mesmas litanias sobre a “verdadeira mulher”, esposa, mãe, bela, sedutora, amante, disponível. As mídias incitam as mulheres e as meninas a adotar as imagens de sedução incompatíveis com um feminino autônomo, sujeito político independente.
Desta maneira, se as teorias feministas decolam em sua produção do conhecimento, as representações sociais que se fazem carne exprimem ainda um feminino construído à sombra da diferença. Vemos assim a volta  aos primeiros objetivos dos feminismos contemporâneos, isto é,  agir para o despertar da consciência das mulheres enquanto sujeitos políticos. Os caminhos parecem traçados em círculo: o fim da viagem traz as mulheres de volta à sua condição “natural”.
Para analisar este bloqueio, que impede a difusão do saber feminista e ao mesmo tempo da tomada de consciência da ação do biopoder, considero que a noção foucaultiana de “dispositivo” é um instrumento teórico ideal.
O que é o dispositivo? É o conjunto de estratégias sociais e de biotecnologias de poder que produzem corpos sexuados significando-os enquanto sexo social. Os mecanismos do dispositivo constituem e são  engendrados por conexões de poder. É assim que as instituições, as leis, as mídia, a linguagem, a divisão do trabalho, as condições de produção e de imaginação sociais são elementos do dispositivo. Criam e são criados em certa configuração de saber e dão origem a poderes diversificados.  (MP 246)
Vemos então que cada formação social em sua escala temporal e seu espaço geográfico interage de maneira singular com as transformações societárias. As cartografias feministas não podem ignorar tais flexibilidades.
Estou exausta de ouvir antropólogas, sociólogas, historiadoras, filósofas dizerem “sempre foi assim” referindo-se à hierarquia binária dos sexos. A análise teórica tem que ser levada às últimas conseqüências e este tipo de afirmação não se funda senão em sua repetição. Funda-se na indolência analítica, que prefere adotar a repetição em vez de buscar a multiplicidade no agenciamento social. Quem é que pode saber tudo sobre todas as sociedades, em todas as épocas?Que tipo de arrogância enuncia tais verdades, senão a presunção do ignorante?
Gostaria de pensar a noção do dispositivo em três momentos, que se imbricam e se entrelaçam para produzir os sexos e as relações de poder que deles são constitutivas. Este biopoder retoma os mesmos temas sobre o feminino com outras ressonâncias, mas a música permanece a mesma.
O primeiro momento é o da sexualidade que pode ser visto hoje como a incitação a uma hiper sexualidade, cuja norma é a heterossexualidade identitária. O segundo momento é o do dispositivo amoroso, ligado à construção social específica do feminino, cuja iteração, repetição de suas particularidades resulta em sua reprodução. O momento que perfaz a tríade é o dispositivo da violência, simbólica e material que pretende domesticar e sujeitar o sexo social feminino pela utilização do medo e da força.
Não são novos eixos na construção social do feminino, entretanto aparecem sob novas formas e estreitamente ligadas.
Os feminismos investiram na redescoberta dos corpos, na tomada de consciência que fez da sexualidade não mais um lócus de servidão, mas sim de florescimento. “O direito ao prazer” fazia parte dos direitos a serem obtidos e tinha um gosto de liberdade.
“O pessoal é político” afirmavam as feministas e isto implicava igualmente o direito a uma sexualidade livre.
Todavia, o dispositivo da sexualidade, regido por um patriarcado ativo, retoma esta conquista em seu proveito: o controle rígido da virgindade de antigamente dá lugar à exacerbação sexual que beneficia o conjunto dos homens cujo desejo nunca parece se satisfizer.
As mulheres não encontram aí qualquer proveito, pois a sexualidade torna-se a base de uma “mulher liberada”. A liberdade almejada era, acredito, aquela das escolhas, dos momentos, do desabrochar do corpos e suas capacidades; não a necessidade insuflada pelos discursos sociais. A sexualidade desmedida obedece à lei da repetição, pois seu exercício torna-se obsessão, centro da vida, nódulo identitário.
Não mais a criatividade dos prazeres múltiplos sobre corpos que se tocam: o prazer se reduz a ansiosas buscas de pontos pré-fixados, tal como o improvável ponto G. A sexualidade feminina que prometia a diversidade de sensações não faz senão imitar a sexualidade masculina, apressada em obter encontros variados e resultados rápidos.
A televisão e o cinema estão entre os mecanismos mais eficazes do dispositivo: as imagens que aí se produzem mostram uma certa sexualidade paradigmática, um modelo de comportamento, uma representação social e sexual que se materializa ao se reproduzir. É a sexualidade sob a égide da necessidade incontornável que faz agora parte integral da imagem da “mulher liberada”.
É não somente a incitação a um certo tipo de sexualidade e de comportamento que aí se encontra, mas sobretudo sua própria produção que se configura.
É assim que cada vez mais jovens, as mulheres vêem seu “direito ao prazer” se metamorfosear no oximoro “liberdade obrigatória”. No Brasil 1/3 das meninas de menos de 15 anos já havia tido relações sexuais em 2006, três vezes mais que em 1996. Quantas meninas não vivenciam uma gravidez indesejada?
O direito à contracepção, duramente conquistado pelos feminismos teria caído em desuso? A utilização de preservativos depende da boa vontade dos homens, de um assujeitamento feminino ainda vivo? Quem tira proveito das “mulheres liberadas”? Quem paga afinal, a adição?
O pensamento straight (correto) identificado por Wittig e a heterossexualidade compulsória explicitada por  Adrienne Rich, são análises de toda atualidade: a representação da “verdadeira sexualidade” no imaginário social é binária e oposta, sua função primeira é de procriar e de fixar identidades sexuadas. A heterossexualidade é deste modo performativa, pois transforma os corpos sexuados em sexo social.
É, portanto a partir da heteronormatividade que diferentes identidades sexuais reivindicam sua existência. O sexo biológico não é senão performance, pois o que importa é o sexo social e as práticas sexuais que o engendram. Todas as biotecnologias do dispositivo são colocadas em ação para que se justifique a sexualidade enquanto razão de viver e núcleo identitário.
É difícil separar o alcance dos três aspectos do dispositivo de tal forma são entrelaçados. O sexo social masculino se objetiva como sendo o referente geral do humano e o feminino, o diferente. Entretanto, sua construção no seio do dispositivo da sexualidade sofre a interferência de um outro dispositivo: o dispositivo amoroso.
O feminino atualmente parece erigido em dois eixos? O do sexo-trabalho-autonomia e o do amor-maternidade-dom de si. As estratégias sociais os misturam e imbricam para perfazer um feminino contraditório: o trabalho e a autonomia face aos apelos da maternidade e da domesticidade; a sexualidade múltipla face ao desejo de uma relação estável, a necessidade de seduzir oposta à afirmação enquanto sujeito livre do olhar de outrem. Estes dois eixos giram em torno da heterossexualidade para a grande maioria.
É a reprodução de antigas fórmulas que caracterizam as mulheres: doces, devotadas, amáveis e sobretudo, amantes. O amor as atualiza na expressão identitária de “mulheres”: é sua razão de ser e de viver. Elas estão prontas ao sacrifício e ao esquecimento de si por “amor”. O dispositivo amoroso é o canto do amor pelas biotecnologias sociais, da vida que floresce na realização de outrem. São as tarefas e os papéis específicos inculcados no feminino que devem coabitar com a “nova mulher liberada”, cuja sexualidade deve ser desenfreada.
Este dispositivo amoroso atrela à representação do feminino toda uma série de deveres, de culpabilidades, de normas à serem seguidas por uma “verdadeira mulher” que vão da aparência ao dom de si sem reserva: as tarefas domésticas – compras, roupa, cozinha, limpeza- o cuidado com as crianças e os velhos, sem esquecer a sedução do marido/ companheiro e as exigências do trabalho remunerado
Através da inculcação dos mecanismos do dispositivo amoroso, as mulheres tornam-se servas, igualmente obrigadas a uma sexualidade que as identifique como « modernas ». A maternidade não é mais restrita ao casamento, mas... tornou-se uma necessidade biológica. As clínicas de inseminação artificial se multiplicam, as lésbicas passam a ter filhos, isto é a biotecnologia, mas também a imagem do feminino, aquele que se traduz e se completa na procriação.
O ventre das mulheres continua a ser controlado pelo  patriarcado, pedra angular de seu poder, quer seja por meio de representação social do feminino, quer seja pela coerção da lei ou das normas sociais. A liberdade sexual sim, mas uma gravidez indesejada deve ser suportada até o fim. Os religiosos, todos deuses confundidos, rugem para melhor ameaçar de prisão e de danação eterna toda mulher que recuse uma gravidez.
Nos contornos dos saberes atuais, as práticas e os discursos sociais agem, de forma insidiosa, para melhor controlar as mulheres, reféns delas mesma, proclamando sua liberdade. Ser mulher é, desta forma, ainda e sempre uma construção do poder cuja novidade é o reaparecimento dos antigos modelos em novas roupagens.
O terceiro aspecto, o dispositivo da violência, material e simbólica, faz parte constitutiva dos dois primeiros. Se a violência doméstica é mais visível hoje em dia, continua a acontecer no silencio e no medo. Quem deu aos homens a possibilidade de aterrorizar, bater, enclausurar mulheres e crianças no domínio privado, senão a condescendência da sociedade patriarcal? As mulheres que denunciam as agressões tantas vezes retiram as queixas, dobrados pelo jugo do dispositivo amoroso: perdoar, esquecer, dar outras chances.
O dispositivo da violência encabeça os dois outros, e se misturam de modo inextrincável. Assim, a construção do sexo social é ela mesma uma violência e a instituição da diferença das mulheres o é igualmente. A noção de “natureza”, para melhor excluir, coagir e discriminar as mulheres faz parte da panóplia do dispositivo da violência. O poder assim instalado, autoriza e justifica todas as agressões, abusos e brutalidades quer seja no espaço público ou privado.
A ameaça da perda de poder e da posse, não é o motor de uma violência que oscila entre o estupro, golpes e assassinatos de mulheres, sem falar do ácido ou do fogo que desfiguram e destroem? Uma nova palavra “feminicídio” foi criada para exprimir esta realidade: elas são mortas pois são mulheres e querem ser livres. São violentadas porque os homens podem fazê-lo, autorizados pela “fraternidade” que o conjunto dos homens partilham. Finalmente, o estupro é um tributo pago pelas mulheres à virilidade, na paz ou na guerra.
Estes três elementos do dispositivo reformulam os pontos de apoiodo patriarcado, mas os mantém firmemente no lugar. Fala-se de liberdade e do desabrochar das mulheres, mas os discursos sobre a “nova” sexualidade e a “nova mulher” reproduzem, de fato, a “natureza” e a “diferença”.
Onde foi parar a produção de conhecimentos feministas, se suas análises radicais da construção da carne em corpos sexuados, das significações e das representações sociais que mantém as mulheres na “diferença” e na inferioridade?
A violência simbólica do silencio faz parte constitutiva do biopoder patriarcal, das biotecnociencias que insistem na retomada dos papeis sexuais “naturais”. Sob a categoria “gênero” a academia finge a incorporação dos estudos feministas para melhor desfigurá-los. Sob a denominação “novos feminismos” pretende-se destroçar a denúncia dos pilares do sistema patriarcal: “a natureza” e a “diferença”.
Na lógica das relações societais que estabelecem os valores, as normas, os métodos analíticos, as categorias de apreensão e de construção do real, os feminismos constituem um saber de ponta, desconstruindo as narrativas mestras, fundadoras do poder patriarcal. A esperança é que tudo que se constrói, pode ser desconstruído.

BIBLIOGRAFIA
BUTLER, Judith. Gender Trouble, feminism and the subversion of identity, New York: Routledge. 1990.
_____. Contingent foundations: Feminism and the question of ‘postmodernism’ in Steven Seidman (ed.) The Postmodern Turn New Perspectives on Social Theory: Cambridge University Press, 1994. pp. 153-170  Online Publication Date: September 2010.
FOUCAULT, Michel. Histoire de la sexualité. vol. 1, Paris: Gallimard, 1976.
_____. Dits et écrits. vol. III, Paris: Gallimard, 1979.
_____. Microfísica do Poder, Rio de Janeiro: Graal, 1988.
HARAWAY, Donna. Manifeste des espèces de compagnie- chiens, humains et autres partenaires Villefranche-de-Rouergue: Terra cognita, Editions de l´éclat, 2010
RICH, Adrienne. La contrainte à l´hétérosexualité, Questions Féministes, n,1, Mars Paris: Editions Tierce, 1981.
WITTIG, Monique. La pensée straight. Questions Féministes, n.7, février, Paris : Editions Tierce, 1980